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PNE: texto do Senado reduz investimento em educação pública

Marcelle Souza

Do UOL, em São Paulo

30/09/2013 06h00

A sutileza da mudança está na ordem das palavras. Em vez de obrigar o governo federal a investir em educação pública, o texto do PNE (Plano Nacional da Educação) aprovado no Senado exige investimento público em educação.  De um modo geral, a troca de alguns trechos fez com que o Estado pudesse incluir no orçamento da educação verbas de programas que incluem parcerias com entidades privadas.

O texto ainda precisa passar por um longo caminho, mas especialistas temem que a nova redação tire dinheiro das escolas e instituições públicas de ensino.

"Na verdade, o que se tentou no Senado foi reduzir a participação da União no financiamento da educação", afirma o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que é o relator do projeto na CE (Comissão de Educação), próxima etapa do texto antes de ser submetido ao plenário.

O PNE é um projeto que estabelece uma série de obrigações até 2020, entre elas a erradicação do analfabetismo, o oferecimento de educação em tempo integral e o aumento das vagas no ensino técnico e na educação superior. Em teoria, deveria ter entrado em vigor em 2011.

Investimento público em educação

Um dos trechos alterados no Senado é o que destina 10% do PIB (Produto Interno Bruto) para a educação. Na versão da Câmara, a Meta 20 define que é preciso "ampliar o investimento público em educação pública". Já no texto dos senadores, "educação pública" é substituída apenas por "educação".

Com a nova redação, podem entrar na conta do governo ações como o Prouni (Programa Universidade Para Todos), que dá bolsas em universidades privadas, além do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e de parcerias com instituições conveniadas. 

"Somos favoráveis a programas como o Prouni, mas precisamos garantir que os recursos sejam utilizados preferencialmente pela educação pública", diz Cleuza Rodrigues Repulho, presidente da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação). Na visão da entidade, é preciso aumentar a participação da União nos gastos que são responsabilidade dos municípios.

Menos investimento na educação pública

PNE aprovado pela CâmaraPNE aprovado pela CCJ do Senado
Meta 20: ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto - PIB do País no 5º (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio.Meta 20: ampliar o investimento público em educação de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto – PIB do País no quinto ano de vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio, observado o disposto no § 5º do art. 5º desta Lei.
Meta 11: triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% (cinquenta por cento) da expansão no segmento público.Meta 11: triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% (cinquenta por cento) de gratuidade na expansão de vagas.
Meta 12: elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18 (dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos, 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento público.Meta 12: elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18 (dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurando a qualidade de oferta.

Ensino superior e técnico

No Senado, o PNE também foi alterado para reduzir a obrigação do governo federal criar vagas na rede pública, tanto no ensino técnico quanto na educação superior.

Na Câmara, a Meta 11 era triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível médio, garantindo "50% da expansão no segmento público". No Senado, porém, um último trecho foi modificado para "pelo menos 50% de gratuidade na expansão de vagas". 

De acordo com a nova redação, a ampliação é possível por meio de programas que ofereçam bolsas em instituições privadas, como já faz o Pronatec (Programa Nacional de acesso ao Ensino Técnico e Emprego), mas não há obrigação de crescimento da rede pública. 

Quanto ao ensino superior, a Meta 12 foi alterada para retirar a obrigação do Estado de criar 40% das matrículas no segmento público, como aprovado na Câmara. No texto do Senado, não há menção às instituições públicas nem referência à possibilidade de gratuidade de vagas.

Divergências

"Isso é muito ruim, porque tira a responsabilidade do poder público de investir em educação pública. Além disso, o texto do Senado joga a responsabilidade de ampliação de vagas para o setor privado", diz Marta Vanelli, secretária-geral da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação).

De outro lado, há quem defenda que a medida pode acelerar o acesso ao ensino superior. "Expandir as vagas por meio da rede privada é muito mais fácil do que fazer isso na pública, onde a ampliação é muito mais cara e demorada", defende Cláudio de Moura Castro, analista de polícias educacionais e autor do livro "Os tortuosos caminhos da educação brasileira".

"Com a alteração, a ampliação das vagas pode ser feita por meio de parceria público-privada, sem nenhuma regulação de fato, e que não vai colaborar para desenvolver o ensino público de qualidade", afirma Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Tramitação

O PNE foi enviado pelo governo federal ao Congresso em 15 de dezembro de 2010 e só foi aprovado pela Câmara dos Deputados quase dois anos depois, em outubro de 2012, após ter recebido cerca de três mil emendas.

No Senado, o PNE já passou pela CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) e pela CCJ. Agora precisa ser aprovado pela CE e, em seguida, será submetido a uma votação em plenário. Caso o texto tenha modificações em relação ao apresentado pela Câmara (como já está acontecendo), ele deve voltar e passar por nova votação dos deputados.

"Esses pontos vão ser discutidos, com grande chance de restabelecermos a redação da Câmara", disse o senador Cyro Miranda (PSDB-GO), que é presidente da CE. "Vamos fazer audiências para ouvir as entidades representativas da educação e o governo, especialmente no que diz respeito ao financiamento da educação", afirmou Álvaro Dias.

MEC: tema foi debatido

Após a publicação da reportagem, o MEC (Ministério da Educação) afirmou em nota que o texto atual do PNE usa como conceito de financiamento da educação o uso de recursos públicos para oferta de vagas gratuitas.

"O atendimento ao cidadão deve ser feito por instituições públicas --universidades, institutos federais, colégios militares-- ou por instituições privadas, em programas de acesso às redes conveniadas de creche, ou nos programas de acesso ao ensino técnico, superior e de pós-graduação, como o Pronatec, o ProUni, o Ciência sem Fronteiras, bem como subsídios para o financiamento estudantil, como o Fies (Programa de Financiamento Estudantil)."

Segundo o ministério, o "tema foi objeto de debate com os movimentos sociais ligados à educação e teve apoio da Undime [União Nacional dos Dirigente Municipais de Educação] e do Consed [Conselho Nacional de Secretários de Educação]". O ministério afirmou ainda que o texto do PNE está em conformidade com o conceito de investimento total usado pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

Procurado pela reportagem, o senador Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB), relator do projeto na CCJ, não retornou aos pedidos de entrevista.

31 Comentários

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Laura Fontenele

Agora que "noises" vai escrever errado! Ahmeodeuso!

Julie Ionache

eu gostaria de saber pq a outra matéria do UOL EDUCAÇÃO sobre os erros de português da Dilma no twitter, escrita pela tal da Karina, teve sua sessão de comentários inteiramente removida. Foi porque todo mundo que comentou criticou a matéria? Ou apontou erros na mesma? Enquanto essa matéria aqui a seção de comentários está em plena atividade com cada comentário um mais estúpido que o outro. A tal da Karina ficou com vergonha? Não aceita receber críticas? Não aguenta bebe leite amiga. Além de mostrar a faceta de como é o lado "profissional" do UOL, ainda faz as pessoas de bobas, porque as mesmas vem até aqui, despendem um tempo escrevendo comentários na expectativa de alguma interação, e de repente, PUFT, os comentários e todas discussões bem como o tempo gasto pelos internautas vai pro ralo. Será que esse comentário também será deletado?


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