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Priscila Cruz


Priscila Cruz

A Educação que precisamos (e queremos)

Getty Images
Imagem: Getty Images

23/05/2018 04h00

Ir à escola é finalmente a realidade da maioria das crianças e jovens no Brasil. Demorou mais do que deveria ter demorado, mas conseguimos superar o patamar no qual apenas a elite do País ia para o Ensino Médio.

Claro que ainda temos muito a avançar nesse sentido: pelo menos 1,2 milhão de jovens entre 15 e 17 anos continuam fora da escola e a desigualdade ainda nos assombra, sendo a porcentagem de analfabetos negros mais do que o dobro (9,3%) da taxa de analfabetos brancos (4%). Apesar disso, diariamente, 48,6 milhões de alunos estão nas escolas todos os dias, com 2,2 milhões de professores, em 184 mil escolas públicas e privadas.

Todo esse potencial humano reunido, para quê? Por que ir à escola é tão importante? Para garantir um emprego? Seria então para ir à universidade? Para o Brasil ser melhor? Sim, tudo isso.

E muito mais. Vamos à escola para conhecer melhor o mundo, a cultura acumulada da humanidade, as bases científicas da transformação da vida. Aprendemos para continuarmos a aprender para o resto da vida: aprender a aprender. Aprendemos a conviver, um dos pilares do propósito da Educação, que nos parece ainda mais fundamental. Na escola estamos no início de uma jornada de desenvolvimento pessoal, ao mesmo tempo em que aprendemos a colocar nosso conhecimento a serviço do coletivo.

Se quisermos vencer os desafios de desigualdade que ainda assolam o Brasil, precisamos defender com unhas e dentes esses propósitos. Podemos comemorar o fato de que esses valores já estão garantidos nos documentos que fundamentam a Educação do País.

Em um dos mais recentes deles, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da Educação Básica, por exemplo, estão previstas habilidades como acolher e respeitar a diversidade humana, tomar decisões com base em princípios democráticos e formular e defender pontos de vista. Mas não basta que estejam no papel, precisamos injetar vida nessas palavras, fazendo de nossas escolas espaços de debates democráticos, com pluralidade de vozes e de temas.

Infelizmente, por todo o Brasil, espalham-se movimentos que caminham na direção contrária. Em diversas assembleias legislativas municipais, estaduais, e até na Câmara dos Deputados, tramitam atualmente propostas de leis que desejam impedir que assuntos relacionados à sexualidade, orientação sexual, gênero e política façam parte dos debates das escolas, sob a alegação de uma suposta “doutrinação” em curso nas instituições escolares.

Tais tentativas vão contra não apenas as concepções pedagógicas mais modernas, mas também as recomendações de órgãos internacionais (por exemplo, a Unesco), com um histórico de lutas a favor da igualdade e da justiça social, que defendem a garantia de ambientes de aprendizagem seguros e não violentos, inclusivos e eficazes, além da promoção da Educação para a igualdade de gênero e os direitos humanos, como está expresso na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

Estamos com o que defende Jacques Delors, que coordenou o Relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI: a escola que queremos e precisamos é aquela em que aprendemos a conhecer, a ser, a conviver e a fazer.

Demanda, portanto, formações docentes, gestão escolar e espaços escolares que valorizem o diálogo entre opiniões divergentes, com respeito ao que todos têm a dizer. Uma escola de todos não pode temer o debate nem invisibilizar assuntos importantes para a construção de uma sociedade mais justa, mais plural e, consequentemente, mais próspera.

Priscila Cruz