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Priscila Cruz


Priscila Cruz

Por que agredimos nossos professores?

Reprodução/Facebook/Marcia Friggi
Imagem: Reprodução/Facebook/Marcia Friggi

13/09/2017 04h00

A imagem da face inchada e vermelha da professora Marcia Friggi, que viralizou nas redes sociais nas últimas semanas, não deveria sair da nossa cabeça tão cedo. Docente de uma escola municipal de Indaial, Santa Catarina, ela levou um soco de um aluno de 15 anos e relatou a violência em um post no Facebook.

O rosto machucado de Marcia é apenas um entre muitos. A violência é realidade no cotidiano escolar no Brasil. A Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Teaching and Learning International Survey, chamada apenas de Talis), cujos resultados datam de 2013, já trazia esse triste diagnóstico: 12,5% dos professores brasileiros relataram serem vítimas de intimidações e agressões verbais por parte dos estudantes semanalmente. A taxa é recorde entre 34 países participantes do estudo. A média mundial é de 3,4%, sendo que em países como Romênia e Coreia do Sul o índice é zero. Realizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a pesquisa ouviu mais de 100 mil professores e diretores.

No mesmo ano, o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) publicou um estudo sobre a violência contra os docentes da rede estadual. O levantamento mostrou que 44% deles afirmaram ter sofrido algum tipo de agressão. Ao mesmo tempo, 84% presenciaram ou souberam de ocorrências violentas no colégio em que trabalham e 57% consideraram violento o ambiente escolar. A pesquisa contou com a participação de 1.400 profissionais de 167 municípios paulistas.

Tomando conhecimento desses dados, podemos chegar à conclusão de que a escola é um lugar violento. Mas essa é uma ideia errada. Não é a escola que é violenta, mas a nossa sociedade. Um país com uma das maiores taxas de homicídio do mundo, conforme constatou a Organização Mundial da Saúde (OMS), está, infelizmente, muito longe de ter uma realidade pacífica. Nesse sentido, nada representa melhor isso do que a situação de calamidade que vive o Rio de Janeiro, onde os tiroteios fazem parte da realidade escolar, suspendendo aulas e vitimando estudantes: o caso da menina Maria Eduarda, de 13 anos, não deve jamais ser esquecido. As escolas localizadas em regiões vulneráveis consequentemente sofrerão mais com os efeitos dos problemas do território.

Além disso, os casos de violência na escola não são exclusividade do Brasil. Dados de 2011-2012 do Departamento de Educação dos Estados Unidos mostram que 20% dos professores das escolas públicas relataram ter sofrido agressão verbal, enquanto 10% afirmaram ter sido fisicamente ameaçados, e 5%, atacados por alunos. Os custos desse quadro são muitos e incluem licenças médicas, contratação de professores substitutos, cuidados médicos e custos jurídicos, entre outros.

A American Psychological Association (APA) também traz mais dados que mostram o problema em território norte-americano. Um questionário aplicado em 2011 a 2.998 professores da educação básica mostrou que 80% deles haviam sido vítimas de alguma situação violenta no último ano dentro da escola. Dos 94% que foram ofendidos, 72,5% foram xingados por seus próprios alunos.

Na Inglaterra, o quadro é semelhante, com destaque para o número de alunos suspensos por terem agredido um docente: 18.970 alunos nas escolas básicas foram afastados entre 2013-2014 devido a ataques físicos aos professores e outros funcionários, como empurrões, mordidas e chutes. Já um estudo de 2014 da Association of Teachers and Lecturers (ATL) e da ITV News mostrou que mais de um quarto dos professores foram agredidos pelos pais ou por responsáveis pelos alunos. 

A solução para esse quadro não está somente na educação – passa, por exemplo, pela segurança pública, pela saúde e pela cultura. Poucas situações deixam mais clara a urgência da intersetorialidade de políticas públicas como a violência na escola. Temos que debater a violência como uma questão estrutural da sociedade brasileira que afeta diretamente a realidade escolar.

Claro que a valorização dos docentes está no centro desse quadro. Os professores precisam de apoio do ambiente escolar e das redes de ensino, além de políticas públicas federais com foco no salário e na carreira, para prevenirem e enfrentarem situações assim. Os alunos agressivos devem ser identificados e atendidos pela equipe pedagógica, que precisa dialogar com as famílias para diagnosticar o problema e oferecer o apoio psicológico necessário. Uma gestão democrática, com a participação dos alunos e de suas famílias, pode construir um clima de respeito pelos docentes.

Como uma instituição social e diversa que serve também como espaço de socialização de crianças e adolescentes, é natural que surjam conflitos na escola. Nossos alunos e suas famílias precisam enxergar o professor como parceiro do futuro das crianças e dos adolescentes, e, consequentemente, da nação. Como principal profissional do Brasil, o professor deve estar a salvo de situações violentas e contar com infraestrutura e apoio para desenvolver seu trabalho da melhor maneira possível. Fazendo isso, ele estará desenvolvendo o país.

Priscila Cruz