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Priscila Cruz


Priscila Cruz

Avaliação na Educação Infantil: Criança aprende muito, mas aprende bem?

Danilo Verpa/Folhapress
Imagem: Danilo Verpa/Folhapress

18/07/2018 04h00

Sabe aquela história de que só se é criança uma vez? Geralmente, falamos isso pensando na alegria, disposição e leveza típicas da infância, que não se repetem em mais nenhuma fase da vida de maneira tão genuína. Mas essa máxima também é verdadeira no que diz respeito ao desenvolvimento infantil, especialmente o que ocorre entre os 0 e 6 anos de idade.

Segundo pesquisas de diferentes áreas, nos primeiros 6 anos de vida, o cérebro infantil é como um foguete em disparada, capaz de romper a atmosfera, faminto por descobrir a imensidão da aprendizagem.

Diante dessa e de outras especificidades, o cidadão pequeno tem uma série de direitos assegurados em leis --como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)--, direitos estes que vão muito além do cuidado e da segurança.

O Estado e todos nós temos o dever de assegurar que nossas crianças possam se desenvolver plenamente, isso engloba não apenas os deveres tradicionais de assistência e proteção, mas também sinaliza um compromisso com o reino do porvir: dar a elas a chance de serem o melhor que puderem, por meio dos estímulos adequados à Primeira Infância. É nesse contexto que a Educação surge como um direito essencial, capaz de combinar cuidado, proteção e desenvolvimento integral.

Para garantir que não haja desvios na vocação dessa etapa, é preciso avaliá-la. Pensando nisso, o Ministério da Educação (MEC) anunciou recentemente que a partir do ano que vem, e a cada dois anos, os profissionais da Educação Infantil terão de avaliar as condições ofertadas aos alunos da Creche e da Pré-escola.

Na verdade, a medida chega atrasada, tendo sido estabelecida em 2010, nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) e ter sido prevista no Plano Nacional de Educação (PNE) para 2016.

A proposta é positiva? Sim, mas é preciso lembrar que estamos falando de um público muito especial e, portanto, é preciso ficar claro o que pode e o que não pode ser essa avaliação. Não pode: ser de seleção, aprovação/reprovação de alunos. Pode: ser um instrumento de acompanhamento do desenvolvimento individual de cada aluno e monitoramento da Educação Infantil.

O primeiro ponto está atrelado ao fato de que essa avaliação não pode ser um exame. Desde a vida intrauterina até os 6 anos de idade, a criança é um aspirador de conhecimento, mas não aprende linearmente como uma criança mais velha.

Digamos que o cérebro infantil na Primeira Infância é um foguete que segue uma rota variável, parando em todo planeta que vê pela frente, aproveitando as oportunidades que aparecem, sem ter o compromisso de atingir uma linha de chegada. Estamos falando de aprendizagem em outra lógica. Diante disso, não faz sentido dizer que João está aprovado e Maria reprovada no primeiro ano da Creche.

Já com relação ao segundo ponto, sobre o que essa avaliação deve ser, o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) da Educação Infantil deve estar concentrado em averiguar se está tudo certo para o foguete infantil alçar voo.

Trata-se de criar um espaço em que a criança possa criar, brincar, inventar, experimentar, sentir, relacionar-se e, no meio de tudo isso, aprender. Esses são conceitos alinhados a uma nova concepção de Creche e Pré-escola, espaços que, felizmente, deixaram há décadas de ser apenas dedicados a cuidado e assistência infantil.

Só se é criança uma vez, mesmo, e não podemos deixar de assegurar que, nesse curto período, os pequenos tenham a melhor infância possível em todos os sentidos. Os estímulos ideais devem permear toda a escola: do mobiliário ao tratamento dos profissionais com as crianças, da massa de modelar à hora do lanche. A avaliação da qualidade desses serviços ajudará os gestores das redes de ensino e os professores a identificarem os aspectos que precisam de melhorias.

Se feita com qualidade, a avaliação do Ensino Infantil será uma oportunidade de, finalmente, darmos um salto rumo a uma etapa de ensino que olha para a criança em sua complexidade e não apenas como alguém que precisa de cuidado.

Essa mudança de paradigma será capaz de criar não apenas oportunidades para as crianças, especialmente as provenientes de situação de maior vulnerabilidade, como para o País, uma vez que a Educação Infantil é a etapa que mais dá retorno à vida individual e coletiva de uma Nação, garantindo redução da desigualdade e aumento da renda média, por exemplo.

Priscila Cruz